quarta-feira, 29 de junho de 2011

CAPÍTULO IX - O BARROCO

Observado um clima de descrédito e novas concepções a respeito das relações entre os homens e o Estado, a partir dos movimentos religiosos da Reforma e Contra-Reforma, destaca-se, na história do pensamento humano um período de transição entre a Idade Média e o Sec. XVIII, do Iluminismo. Esse período, chamado de Barroco, tem como expoentes FRANCISCO SUAREZ e HUGO GRÓCIO. Os pensadores do barroco questionaram a Idade Média, e procuraram recuperar a Escolástica, que, com a Igreja, caiu no descrédito dos Renascentistas. Surgiu o Barroco, pois, nos países que ficaram fiéis ao Catolicismo e, sobretudo, na Espanha. O primeiro, SUAREZ, constrói seu pensamento através da essência do próprio direito, estando aquela muito mais na lei do que numa ordem universal de que a lei fosse já uma manifestação. Assim, enquanto S. TOMÁS partia do direito para a lei, o filósofo-jurista da Companhia de Jesus parte da lei para o direito. Sua obra chama-se “DE LEGIBUS”. Deus é para ele, antes de tudo, um legislador. Numa linguagem moderna, dir-se-ia que SUAREZ, como jurista é mais normativista do que ordinalista. O seu “Tratado” é sobretudo um estudo atento dessa fonte do direito: a lei. Sua essência, suas características e requisitos, suas formas e modalidades, desde a lei eterna até a lei humana positiva. Enquanto para o tomismo a lei era considerada um ato essencialmente intelectual, que se dirige para reger o comportamento de seres racionais, no suarismo este elemento, por assim dizer, desloca-se: a lei passa a ser vista, antes de mais nada, no seu momento voluntário. Ao momento racional e intelectivo vem juntar-se, dominando-o, este momento ativo e voluntário. Em relação ao Estado, como para S. TOMÁS e para os humanistas, também para SUAREZ o Estado, “sociedade perfeita” é um produto da natureza racional do homem, não tendo no pecado o seu mínimo fundamento. Inclusive entre os anjos, no estado de inocência, existem principados “como consta das escrituras”. E isto deve entender-se não só do poder diretivo, mais filho da razão, como ainda do coercitivo, mais ligado à imperfeição humana, visto não haver jurisdição possível sem coação e visto o primeiro destes poderes, sem o segundo, ser ineficiente. E eis-nos assim chegados à magna questão do poder político ou soberania. Sem esta, o Estado não pode existir. O homem nasceu animal social e político, como nasceu racional; e, como não é possível o Estado sem poder e soberania, segue-se daí que estes poder e soberania tampouco são criação arbitrária do homem, mas sim exigência da mesma lei natural e racional. Por outro lado, se o poder é inerente a estes “modos de ser” do homem, daí decorre ainda que ele, inicialmente, não pode deixar de residir na própria comunidade politicamente organizada para a qual existe. O poder sobre os homens, que não vemos estar nas mãos de Deus nem dos anjos, não pode pois estar nas mãos dos próprios homens, embora não considerados separadamente, uti singulis, nem mesmo como multidão amorfa, mas só como comunidade perfeita e já politicamente unida, uti universi. É assim que SUAREZ desenvolve suas idéias democráticas: a da contratualidade na base do Estado e da posterior transferência da soberania do povo para o príncipe. Uma é a do pacto ou contrato social pelo qual os homens se reúnem em comunidade perfeita; a outra do pacto ou acordo pelo qual eles transferem, depois, o poder para os governantes. Cumpre salientar que, segundo SUAREZ, o príncipe, conquanto superior ao povo, se achará sempre sujeito ao direito, aos preceitos da lei natural e eterna, quando não aos do “pactum subjetionis”, sendo lícito à comunidade, não só a resistência passiva às leis injustas, como inclusive a resistência ativa e a rebelião contra os tiranos e ainda a sua condenação à morte, ou regicídio, por autoridade pública. De seu turno, HUGO GRÓCIO preocupou-se em desenvolver, criando mesmo, um direito internacional ou das gentes. Na sua época, ou primeira metade do século XVII, todos os Estados da Europa já estavam definitivamente fundados e, no radicalismo de sua soberania, tornados independentes uns dos outros, animados de tendências centrífugas e propensos a fazerem a guerra uns com os outros por numerosíssimas razões. Com a descoberta do Novo Mundo, as rivalidades provenientes da expansão comercial e as resultantes das novas divergências religiosas provocadas pela Reforma, as guerras e as lutas civis ameaçavam romper por todos os lados. Desfeita a “respublica christiana” da Idade Média, como realidade jurídica, a idéia de Cristandade, como força moral, continuava a pairar sobre eles, como outrora a idéia de Império sobrevivera ao Império Romano, conservando-se ainda a Europa profundamente cristã. Ora, foi precisamente da necessidade de harmonizar estes dois fatos que nasceu a obra de GRÓCIO. Tratava-se de prevenir esta situação e, para isso, de fundar ou fortalecer um direito, superior ao de cada povo, que prevalecesse nas relações entre todos, ainda durante o estado de guerra. E este foi, sem dúvida, o escopo principal do grande jurista holandês. Enquanto que MAQUIAVEL só se preocupou com os interesses vitais das repúblicas, BODIN com a construção jurídica da idéia de soberania e SUAREZ, predominantemente, com a limitação do poder real, GRÓCIO tomou sobretudo a peito defender a idéia de tolerância entre os povos cristãos, a união das confissões cristãs e a juridificação e humanização da guerra. Em matéria de Estado, GRÓCIO partiu do princípio de que os homens vivem necessariamente em sociedade por virtude de um seu apetite social, semelhante ao instinto que, segundo ARISTÓTELES, fazia do homem um animal social, vendo neste fato não só um fato empírico mas, principalmente, um ditame da razão. Razão e fato empírico coincidiam assim, dentro de uma concepção filosófica de “lei eterna” que era para ele, como para os estóicos, o alicerce do direito natural; este surge como fundado, ao mesmo tempo, na razão e na natureza, na essência idênticas. Além disso, com a natureza e a razão coincidiam, ainda, em terceiro lugar, um fator de utilidade a impelir também os homens para sociedade. Para explicar a origem da sociedade, Grócio parece tomar este conceito de origem muito mais como fato histórico, pois nos fala da intervenção daqueles três fatores como de alguma coisa que, em dado momento, teria levado os homens a transitarem de um “estado de natureza” para o de “sociedade” mediante um “contrato”. Para ele, o poder reside em princípio no povo como corpo social, à semelhança da alma no corpo, mas, com isso, confundia os conceitos de povo e Estado. De que forma essa soberania transita do povo para o príncipe, contudo, Grócio não é explícito. Grócio é tido como um continuador do humanismo, mais preocupado com o futuro do que com o passado. Ele se encontrava entre dois mundos, num período de transição, como dissemos. A época iria observar outros momentos e germes de idéias ainda ligadas à Renascença que Grócio não recolheu, como o do pensamento científico natural e matemático de Descartes. A captação desses momentos e germens coube a HOBBES, para uma nova fundamentação filosófica do direito e do Estado.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

CINZAS...

Orpheu acordou,
Esfregou os olhos
Ainda com sono,
Olhos de ressaca.
Eurídice se fora.
O dia chegou
E, ele, agora,
Que vai fazer?
Nada.
Seu amor, puro,
Cantado em prosa
E versos,
Agora é coisa do passado,
Do carnaval obscuro
Que o tempo guardou.
(Do livro "Prosa e Poesia", Juízespoet@s, LTr, 2011)