terça-feira, 17 de janeiro de 2012

São Paulo, São Paulo!

Pretendia escrever algo para comemorar o aniversário de São Paulo, esta cidade que não é a minha de nascimento, mas que acolheu meus pais, comigo ao colo, logo após ter chegado ao mundo. Entretanto, deparei-me com o escrito por um colega, do grupo dos juizespoet@s, NEY PIMENTA, Juiz em Vitória-ES, que, sendo forasteiro, melhor conseguiu, com o poder de síntese do poeta, em poucas palavras, transmitir o mundo que é São Paulo. E ele apresenta seu trabalho como sendo "o microconto de um poeta medíocre". Caberá a vcs. avaliarem. 

Eis seu relato:

"Há alguns anos, voltando para Vitória, me impressionei com a visão de São Paulo à noite e acabei escrevendo o que desejava que fosse uma poesia. Não ficou bom e guardei. A cena se repetiu agora, nesses primeiros dias de 2012, e resolvi que me era mais fácil fazer da ideia - e desse meu deslumbre - um microconto que, agora, divido com vocês. Espero que gostem:

PARTE I
É dessa pequena janela que te olho com atenção. Cada vez mais alto e cada vez mais distante, melhor ainda te observo, porque perco os detalhes e não me distraio. E somente assim é que te vejo inteira.
As tuas luzes, milhões delas, são excitantes aquarelas... vermelhas as dos carros nas ruas escuras, amarelas as dos apartamentos acesos. São azuis as dos neons que te vendem a consumidores ávidos e verdes as dos sinais (que teus filhos chamam faróis) a transformar as lanternas dos carros, uma vez abertos, no sangue que vejo fluir por suas artérias.
São Paulo, São Paulo, nunca fui teu como tu nunca fostes minha. Mas a cada subida e a cada descida me encanta a tua imagem. E de tanta aflição pelos prazeres que nunca vou gozar, meu peito se estreita.
PARTE II
Dessa mesma janela, que com atenção te olho, pensando nessa gigante que você é, imagino alguns destes que são teus de corpo e alma, porque em tuas avenidas nasceram ou porque te escolheram como lar. Imagino João e Maria, nascidos um para o outro. João é tudo que Maria quer de seu homem. Maria é a mulher com que João sonha desde os primeiros pelos nascidos abaixo da cintura. Mas por causa do teu imenso tamanho, jamais irão se conhecer.
Você os conhece bem, pois João é teu filho desde a barriga da mãe. Maria é tua filha por escolha. João é Consolação. Maria é Butantã. Uma pequena linha levemente tortuosa no Google Maps...
Viverão cem anos em tuas entranhas sem pisar a mesma calçada; não passarão perto um do outro. Têm almas gêmeas e, ainda assim, passarão a vida procurando os olhos que a tua grandeza escondeu."
 

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

DEMÔNIO BATIZADO

Retomando o prazer de escrever neste espaço, procurei dentre tudo quanto li a respeito do affaire STFxCNJ - e a respeito do Judiciário - o que pudesse demonstrar que muito do que se diz é propaganda dirigida para denegri-los, com imagens de grande apelo emocional, mas distorcida para aparentar um Poder corrompido a ponto de ser desacreditado. Encontrei no trabalho produzido pelo colega Francisco Meton Marques de Lima - Prof. da UFPI e Desembargador do TRT-22ª Região - Piauí, tudo quanto se precisa saber, sem qualquer subterfúgio. Ei-lo:




"Diz a crença popular que o diabo mais perigoso é o demônio batizado, porque não teme a cruz nem a oração. Batizado, é o cristão que caiu e se tornou um danado.
A ditadura é como o demônio, vem disfarçada de todos os modos, os que lhe convém para ludibriar os incautos cidadãos. Ora aparece sob o estereótipo de besta-fera, ora de anjo. O que importa é enganar.
Numa nação amordaçada pela apatia, pela indiferença, pelo medo de falar, anestesiada pela bebida e pelas drogas, alienada pela péssima música, pela compra oficial das consciências, ninguém grita nem quer ouvir o clamor de outrem. Nesse deserto sem eco, arrisco uma costela e emito algumas impressões.
Um episódio ganhou as páginas dos jornais nos últimos dias. O Ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu liminar nos autos de ADI movida pela Associação dos Magistrados Brasileiros, no sentido de que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) não puna juízes antes do devido processo perante as Corregedorias dos seus Tribunais. No mesmo sentido, o Ministro Lewandowsky suspendeu determinação da Corregedoria do CNJ que mandava quebrar sigilo fiscal e bancário de milhares de juízes, sem um devido processo legal prévio. Portanto, nada mais fizeram suas excelências, do STF, que reatar a ordem constitucional acintosamente violada pela sanha arbitrária da Corregedoria do CNJ, a qual arrebata as competências originárias e profana os princípios mais caros de todas as democracias do mundo, os da ampla defesa, do contraditório e do duplo grau de jurisdição.
No entanto, causou estranheza órgãos da imprensa e a OAB alinharem-se de afogadilho ao lado do ilegal e do arbítrio e contra as decisões restauradoras da ordem democrática. Em qualquer nação séria do mundo, não se ousaria pôr em xeque as decisões da mais alta Corte de Justiça do País, mormente quando estas restauram a ordem constitucional transgredida.
  
A quem interessa uma magistratura fragilizada? Ao mesmo interesse por uma imprensa amordaçada. Pois são as duas instituições que mais incomodam o arbítrio e que mais socorrem a sociedade e o cidadão nas agruras das ditaduras. São os profissionais da imprensa e da justiça que mais sofrem as censuras e os castigos dos regimes arbitrários, exatamente por se postarem à frente dos perseguidos. Nos regimes de chumbo, são os magistrados que põem suas cabeças a prêmio.
​       Carl Schimit advertia em seu livro Teoria da Constituição, publicado em 1928, que a Constituição democrática da Alemanha, de 1918, era tão democrática que trazia o germe da ditadura. Foi o que aconteceu. A dita Constituição abriu as portas à aventura do Nazismo, a pior experiência humana. E a imprensa esteve ao lado desse desastre. No Brasil, em minúsculo exemplo, comparado ao sinistro tedesco, a grande imprensa também apoiou a instalação da ditadura militar de 1964. Depois, sofreu o rescaldo dessa fogueira maldita.
​      Estranhamente, um fenômeno se verifica. O Governo subornou os pobres, corrompeu as lideranças, cooptou os empresários e dominou setores da grande imprensa. Felizmente, graças ao regime democrático, não conseguiu calar os profissionais da comunicação e os órgãos sérios da imprensa, que continuam com espaço aberto ao bom debate.
O povo está à deriva, sem lideranças sociais, sindicais e políticas. Mas o que mais preocupa é a tomada de posição de órgãos destacados da imprensa, sem forças para censurar, caudatários das políticas centralistas do governo. Assim é que, setores da imprensa voltam-se contra a magistratura, exatamente a última trincheira da cidadania. Isto sem prévio conhecimento do que realmente esta acontecendo. Hay magistrados, soy contra! Simplesmente é a favor do arbítrio do CNJ e pronto! Com efeito, sem medo da afirmação, os juízes são os servidores públicos que mais trabalham neste País das Maravilhas, que a mais sacrifícios pessoais e familiares estão submetidos. Em qualquer comunidade, o magistrado é o profissional mais acreditado e respeitado. É na magistratura que se registra o menor índice de corrupção de todo o serviço público.
Surpreende também a OAB, que sempre somou às causas democráticas, destilar seu ódio contra a magistratura, exatamente sua consorte nos tempos de chumbo. Destarte,estranha-se que a OAB, que seria a maior defensora do devido processo legal, das garantias constitucionais da ampla defesa, da presunção de inocência até que haja um mínimo de apuração dos fatos, empunhe a bandeira da jurisdição única, arbitrária, kafkiana do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) contra os magistrados.
Ora, aos piores bandidos a OAB defende ampla defesa, contraditório, inúmeros graus de jurisdição, no que está certa. Aos magistrados, no entanto, a forca, sem prévio processo. Basta o sacrossanto CNJ fazer seu divino (pré)juízo. Exatamente contra a instituição menos “bichada da sociedade”. Aos advogados, é assegurado o sigilo do processo disciplinar. Para os magistrados, a OAB brada por uma devassa pública, julgamento por um órgão único, de composição política, uma espécie de tribunal de exceção, que não respeita nem a Justiça, restando a essas almas penadas o socorro único do STF, na pena de alguns corajosos Ministros.
A Justiça, a verdadeira, não a justiça política, com todos os seus percalços, ainda é o grande dique de proteção da cidadania, funciona como o muro das lamentações de todos os que sofrem as injustiças do arbítrio governamental e dos órgãos sociais. São os juízes que arriscam suas vidas fazendo valer a lei; que sacrificam suas férias, seus finais de semana e o que seria repouso noturno em favor das causas que lhes são submetidas. Há desvios de conduta, sim. Mas como exceção. De 16 mil juízes apurou-se algo contra menos de 5%, e comprovou-se algo contra menos de 1%. Portanto, é um atestado de lisura da categoria. Ao contrário de outras classes profissionais, em que o índice é assustador.
A quem agrada fragilizar a Justiça? Com efeito, uma magistratura forte não interessa ao arbítrio dos governos, aos corruptos, aos delinqüentes profissionais e aos que lhes dão suporte.
Cumpre esclarecer, que o CNJ não foi concebido para julgar ninguém nem para subjugar os magistrados. Trata-se de um órgão politicamente composto, com a nobre missão de velar pelo bom andamento da Justiça, aparelhando-a, apoiando suas ações e, por fim, reprimindo os maus exemplos. Nunca, porém, para substituir os Tribunais e suas Corregedorias. Diria eu que a Corregedoria do CNJ deve cingir-se a correicionar as Corregedorias dos Tribunais, contra eventuais leniência e/ou corporativismo, respeitando, com isso, sem se omitir, a autonomia dos tribunais, conferida pelo Poder Constituinte Originário. Por sua vez, deve agir como órgão da Justiça, com discrição, seriedade e dentro dos limites constitucionais, integrador dos valores do Judiciário. E não como um órgão político, desintegrador e de propaganda deletéria do órgão pelo qual deve velar. Destarte, a magistratura não está contra o CNJ, ao contrário, tem-lhe o maior respeito e acatamento. A magistratura põe-se contra o arbítrio, a invasão de competência, a transgressão dos princípios constitucionais, venham de onde vier, esse é seu papel.
Repito, a sociedade brasileira está refém de uma democracia disfarçada, que corrompe o povo com a esmola “dos bolsa”, em vez de promover o desenvolvimento e trabalho; as lideranças sindicais e as sociais nos cabides de emprego; as lideranças políticas nos ganchos do orçamento público; os empresários nos financiamentos oficiais; as Igrejas, nas múltiplas isenções; humilha os funcionários públicos no arrocho salarial; e promove contra a classe média um assalto fiscal. Tornamo-nos uma sociedade democrática de boca arrolhada, em que ninguém grita, ou que o grito não tem eco. Ninguém tem coragem de criticar, ou a crítica vai custar caro.
Exorta-se para que toda a Imprensa e a OAB, parceiras da Magistratura nos momentos difíceis, também não sucumbam nos tentáculos do polvo maldito.
A ditadura ronda. Agora, disfarçada de democracia. O diabo na forma de anjo. Pior. Um demônio batizado, que zomba da cruz e das orações. Orai e vigiai!"

Concordo e assino em baixo, Genesio Vivanco Solano Sobrinho.