quinta-feira, 29 de abril de 2010

DA FLEXIBILIZAÇÃO OU DIREITO DÚCTIL DO TRABALHO.

Fizemos este estudo a partir da leitura de José Eduardo de Resende Chaves Júnior , em trabalho classificado em 2º lugar no 2º Concurso de Monografia do TRT/2ª Região, no qual aborda o assunto do dilema entre o negociado e o legislado, a que na prática se reduziu o tema, de maneira clara e convincente, sob o título “A Flexibilização e o Direito Dúctil do Trabalho” .

Afirma ser falsa a dualidade convencionado X legislado, ressaltando que “privilegiar essa perspectiva dual vai sem dúvida nos conduzir a um enfrentamento, dilema que não será fácil superar de uma forma convincente, se considerarmos que estamos operando a partir de uma lógica determinada e situada: a lógica da sociedade capitalista”, e imagina um remédio homeopático para fugir do labirinto sem saída que essa perspectiva parece sugerir. Homeopático porque segue o princípio basilar da homeopatia que é similia, similibus curantur – ou, semelhantes curam-se com semelhantes.

Segundo o articulista, a “regulação estatalista, a partir de uma ótica dilemática, funciona como aparelho de intervenção alopática”. Nessa concepção “se privilegia o poder vertical do Estado em detrimento do súdito”.

Numa atuação homeopática, “a regulação do direito dúctil do trabalho dar-se-ia através do poder vertical para horizontalizar e multiplicar as bases dialógicas da negociação”. Nesse entendimento, prossegue, “o Estado, ao invés de preocupar-se com a fixação de limites rígidos das necessidades dos trabalhadores – necessidades essas que não podem e não devem ser apriorísticamente fixadas – ele deveria se voltar principalmente para a efetivação dos mecanismos legais necessários à garantia da existência de um diálogo igualitário entre as partes”.

O Estado, portanto, deve atuar prioritariamente de uma forma supletiva, porque, em geral, a fixação de mínimos tem sempre dois efeitos colaterais perversos: congelar esse mínimo e transformá-lo na prática em teto.

Essa atuação minimalista do Estado, pois, tende a garantir e propagar a efetivação do diálogo entre trabalho e capital, permitindo a criação de condições mais propícias à multiplicação de direitos coletivos específicos. Segundo o autor em causa, não resta dúvida de que “a conquista de novos direitos sociais pela via legal, além de mais complexa, é bem mais lenta”.

A segundo forma aventada para a regulação do direito do trabalho é pelo Mercado. Essa via, contudo, não é a mais apropriada, pelo fato de o trabalho humano não poder ser equiparado a coisa, para fins de negociação.

Mas, dir-se-á, como não coisificar o trabalho numa negociação coletiva, por exemplo? Como não torná-lo uma mercadoria? Para que se tenha um razoável sucesso na negociação, há, portanto, que se cercar a dialógica da negociação de condições jurídicas para que o diálogo entre os parceiros da produção se verifique da forma mais democrática possível.

Por terceiro, há a via da regulação comunitarista, sendo esta fundada no conceito da participação. Mas, quando se fala em participação em sede trabalhista, “o importante é não limitá-la ao conceito de participação nos lucros e resultados”, ou sob o aspecto remuneratório. A participação comunitarista é um conceito bem mais abrangente. Envolve a participação no estabelecimento e na empresa. Essa participação no estabelecimento envolve os fatores ligados à produção, enquanto a participação na empresa envolve os aspectos estratégicos do empreendimento.

Portanto, quando se fala em reforçar os vínculos de solidariedade, não se está a defender uma proposta romântica ou de moralismo autocomplacente. Fala-se, sim, em “politização do espaço empresarial”, no sentido de enfatizar a função social da empresa e da propriedade.

Em conclusão, a respeito das três formas de regulação, defende o autor mencionado a interação combinatória entre os três tipos, de modo a interagi-las com o pilar da emancipação social do trabalhador, via art. 7º, caput, in fine, da CF, ou a locução “além de outros direitos que visem à sua melhoria da condição social”, pois não se pode consagrar o trabalho subordinado como direito fundamental, mas, sim, o trabalho emancipatório é que deve ser alçado a tal categoria.

Complementa Chaves Júnior que, para “se proceder ao resgate da emancipação, a teoria jurídica deve passar por adaptações necessárias, uma vez que ela é construída, de uma forma hegemônica, a partir de pressupostos regulatórios, com excessiva preocupação sistemática” e, “não estivesse o termo flexibilizar tão dominado pelo discurso neoliberal, e tão jungido à polarização Estado-mercado, poderíamos tomá-lo emprestado como metáfora da releitura do direito revisitado pelos ideais de emancipação”

Finalizando, diz o mesmo autor:

“A idéia de ”ductibilidade constitucional” utilizada por Zabrebelsky é muito atraente. Partindo da hoje recorrente distinção entre regras e princípios, o constitucionalista afirma que enquanto o direito legislativo é baseado em regras, AS NORMAS CONSTITUCIONAIS SÃO, PREPONDERANTEMENTE, PRINCÍPIOS. As regras se esgotam em si mesmas, NÃO TÊM NENHUMA FORÇA CONSTITUTIVA FORA DO QUE ELAS MESMAS ESTATUEM. A elas se obedece, AOS PRINCÍPIOS SE ADERE.
Considerando que os princípios carecem de base positivada – segue Zabrebelsky concluindo – seu significado não pode ser determinado de forma abstrata, mas, apenas em casos concretos. Para ele a idéia de que somente as estruturas normativas assentadas em pressupostos poderiam configurar, tecnicamente, a aplicação dos direitos, faz com que se confunda o constitucionalismo contemporâneo com alguma forma de jusnaturalismo ou mesmo com um juízo estritamente político.
Se concebermos [...] os direitos, a partir de uma validade prática e não somente a partir de uma validade lógica, a idéia de direito por princípios pode se explicar em tons de razoabilidade ou prudência..
A pluralidade de princípios e de valores objetivados na Constituição justifica o tratamento não formalista ou não-hierárquico dos fenômenos jurídicos.”

DO NOVO DIREITO DO TRABALHO

De tudo, pois, que dissemos até aqui já podemos concluir que a Constituição Federal de 1.988, ao contrário de, como afirmam alguns, ter apenas incorporado ao seu texto normas do Direito do Trabalho tradicional, positivo, transformou as conquistas trabalhistas obtidas através dos anos EM PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS, de um Direito Dúctil do Trabalho, a que se reporta o ilustre magistrado José Eduardo de Resende Chaves Júnior, em seu premiado trabalho a que nos referimos atrás.

Constitui-se, dessa forma, em um NOVO DIREITO DO TRABALHO que nos cumpre estudar mais detidamente e fazer aplicar em sua plenitude, para que não se torne letra morta a intenção do Constituinte.

A partir dessa constatação realista, mais que teorética, podemos dizer, com Jorge Luiz Souto Maior que o direito é um instrumento de realização da justiça social, que tem como meios de atuação a “constitucionalidade democrática das normas, a sistematização do direito, pela utilização da noção de princípios, e a normatização interpretativa da regra positivada”, e que, o direito do trabalho, por sua vez, é o “instrumento de equilíbrio entre as forças do capital e do trabalho”.

Por esse motivo, o Direito do Trabalho deve se confundir e consolidar, através do que o sociólogo Boaventura Souza Santos, referido por Chaves Júnior chamou de a modernidade, assentada em dois pilares: o da emancipação e o da regulação. Nas relações de trabalho, sob o novo enfoque da flexibilização, a lei se flexibiliza para atender, não ao mercado, ou à Constituição, mas aos fins culturais do trabalho humano, de modo que a autonomia privada coletiva só iria desconstruir direitos, para reconstruir soluções mais eficazes em termos de emancipação social do trabalhador.

Na busca dessa emancipação do trabalhador, teremos de desconstruir o Direito do Trabalho tradicional e reconstruir o que Chave Jr. chama de Direito Dúctil do Trabalho, que seria o ramo da ciência do direito que tem por objeto as normas jurídicas que disciplinam as relações de trabalho (e não mais, apenas, subordinado), determinam os seus sujeitos e as organizações destinadas à proteção desse trabalho, em sua estrutura e atividade.

Estariam incluídas, desde já, as relações de trabalho autônomo, de trabalho avulso, de trabalho cooperativo e tantas mais que passariam a ser objeto de uma regulação multiplista, “que privilegia as várias combinações possíveis entre os meios de regulação do conflito” (do Estado, de Mercado e Comunitarista).

Tomando-se como exemplo o Trabalho Cooperativo, através das Cooperativas de Trabalho, além de integrarem-se nos direitos dos cooperados aqueles elencados pela Constituição, mediante negociação e regulação comunitarista, deveria ser preocupação dos órgãos de Estado, na fiscalização de seu cumprimento, não a exclusão social do cooperado da “proteção” do Direito do Trabalho, mas, antes, a sua inclusão como sujeito da proteção do Direito Dúctil, ou do Trabalho em Geral.

A partir disso, deveria ficar a cargo do Ministério do Trabalho a fiscalização do cumprimento das normas que dispõem sobre a constituição e funcionamento das entidades de trabalho cooperativo, assim como da Justiça do Trabalho intermediar os conflitos pertinentes.





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